LITERÁRIO
de Tamara Lebron
O Phil gosta de passar o tempo fazendo anotações num pequeno bloco de notas amarelo e desgastado, que carrega o dia todo, todos os dias. Ele o guarda no bolso de trás das calças, dobrado e amassado. Vejo-o muitas vezes junto às portas automáticas rabiscando como um maníaco, sem prestar atenção a mais nada. A Bernice, a caixa que trabalha comigo no turno da manhã, acha que ele faz anotações sobre o pessoal para reportar à chefia. Ela acredita plenamente que estão tentando despedir a todos nós e nos substituir por máquinas de conferência automática.
Gosto do Phil. Ele é engraçado e fala inteligente. E quando sorri, as linhas do seu rosto dobram um pouco, mas a sua pele permanece lisa e cremosa.
Assisto o Max ocupado, preenchendo as prateleiras com suplemento vitamínico.
O aparelho de som está sempre ligado para os clientes. Em um dia qualquer, ele toca várias versões de Send in the Clowns (Mande entrar os palhaços) e outras músicas que minha mãe ouvia o tempo todo. Closer to you (Mais perto de você) está tocando agora. Nem imaginas como a voz da Karen faz eu me sentir feliz, triste e desgrenhada. Embora eu não fosse nascida quando The Carpenters estavam no auge, eu sinto por ela. De verdade.
E enquanto viajava na voz dela, somos interrompidos por um estrondo, seguido por uma quietude assustadora. “O que foi aquilo?” Os olhos castanhos da Bernice estão bem abertos.
O Phil recolhe suas anotações e as guarda no bolso. “Não sei.” Ele sai pela porta e nós o seguimos. As ruas estão calmas, como de costume a esta hora. Um caminhão ao fundo do quarteirão está fazendo uma entrega, mas os homens pararam de trabalhar. Max aponta para a direção sul de nós. Podíamos ver arcos de fumaça cinzenta contra o céu azul em pó, mesmo onde as torres deviam estar. Não tenho a certeza do que está acontecendo. Nenhum de nós sabe.
Bernice tira um cigarro do bolso de sua bata vermelha e começa a tragar grandes quantidades de nicotina.
Max tem as duas mãos no topo da cabeça. “Que merda!” ele murmura.
Phil se aproxima de mim e envolve os seus braços quentes nos meus ombros. Nunca estive tão perto dele e ele cheira a refrigerante de gengibre. Sua silhueta fina contra a minha. Meu peito está batendo forte, sinto a batida pulsando em meus ouvidos. Um tumulto vulcânico. Um medo sombrio do desconhecido. Hesitante, enrolei o meu braço em volta da cintura do Phil. Ele se aproxima de mim, e agora meu coração está em suas mãos.
Sobre a poeta:
Tamara Lebron ganhou seu MFA na Universidade de Long Island sob a tutela de Lewis Warsh, a quem ela é eternamente grata pelo seu apoio e palavras encorajadoras. Ela tem trabalhos publicados em Ellipsis Zine e no Medium.
Rodapé:
Homenagem a Lewis Warsh: poeta, escritor de prosas e um dos professores fundadores do programa MFA de Escrita Criativa, na Universidade Long Island, Campus de Brooklyn. Professor Warsh faleceu em 15 de novembro de 2020. Seus alunos e amigos honram sua memória… escrevendo.
Traduzido do Inglês para o português por Mychelle Medeiros/ Revisado por Doralice Silva