As plataformas digitais lucram com a autoexploração e com o falso emprego autônomo de seus “empregados”. A Comissão Europeia está, agora, propondo diretrizes para que os países europeus previnam essa precarização do emprego. O objetivo é controlar as condições de trabalho em empresas cujo propósito seja o de empregar fornecedores e outros falsos trabalhadores autônomos.

Entenda qual é o problema — O falso emprego autônomo e a autoexploração

Condições de trabalho precárias, ausência de segurança no planejamento, riscos à saúde e estresse, estresse, e mais estresse! Os trabalhadores de plataformas digitais correm do ponto A ao ponto B todo dia e quase não têm tempo para ir ao banheiro durante o horário de trabalho. Eles nos trazem nossas encomendas, nossa comida e nos levam para casa à noite porque usar táxi é caro demais. Eles são autônomos, trabalham para plataformas digitais e, acima de tudo, têm um elemento em comum: quase não possuem direitos.

Plataformas digitais: O conto de fadas das “intermediárias”

Plataformas digitais como Uber, Mjam e Deliveroo empregam trabalhadores autônomos e os conectam a consumidores em potencial. Essas plataformas são intermediárias, não empregadores; sempre enfatizam esse aspecto porque, se fossem empregadores, teriam que se responsabilizar pelos planos de saúde e pela segurança dos seus funcionários. Teriam ainda que pagar o salário-mínimo e cumprir com as leis trabalhistas em vigor na Europa, o que não ocorre — pelo menos não por enquanto.

“A economia digital é frequentemente apresentada como a economia do futuro. Não há dúvida de que ela oferece novas perspectivas às empresas, porém à custa dos trabalhadores”, aponta Aude Cefaliello, um pesquisador do European Trade Union Institute (ETUI, ou Instituto Sindical Europeu).

O chefe digital: um algoritmo

Na verdade, os trabalhadores autônomos são empregados. Eles devem prestar contas a um chefe digital: um algoritmo que os monitora e que avalia seu desempenho. Os empregados mais eficientes recebem bons turnos, enquanto os menos eficientes são penalizados. A comparação constante causa pressão sobre os trabalhadores e os leva a assumirem muitos riscos; em alguns casos, principalmente no trânsito, isso gera, com frequência, acidentes relacionados ao estresse (https://www.bbc.com/news/technology-45247655, em inglês).

A resistência aumenta na Europa: direito a férias e a salário-mínimo

Atualmente, vários países estão tomando ações legais e judiciais contra a exploração (matérias seguintes em inglês):

Essas decisões têm algo em comum: “Derrubam o mito dos ‘prestadores de serviço independentes’ e dos ‘microempreendedores’ e reconhecem que essas pessoas são, de fato, empregados dependentes que devem ter direito a toda a proteção que confere a legislação trabalhista”, afirma Cefaciello.

Novas diretrizes da Comissão Europeia: afastar-se da não intervenção, rumo à justiça

As propostas (link em alemão) da Comissão Europeia se referem essencialmente aos três seguintes pontos:

  1. Critérios claros quanto à existência de vínculo empregatício: o critério de controle para a situação de emprego deve promover clareza e possibilitar proteção legal. Ao contrário dos trabalhadores autônomos em questão, os empregados têm direito a salário-mínimo, barganha coletiva, horas de trabalho regulamentadas, aposentadoria, bem como a férias e a licenças médicas remuneradas.
  2. Controle das condições de trabalho:o uso de algoritmos deve se tornar mais transparente. Humanos, e não aplicativos digitais, deveriam controlar o cumprimento das condições de trabalho. Futuramente, os empregados e os autônomos deverão ter a possibilidade de confrontar decisões tomadas de maneira automatizada nos tribunais.
  3. Transparência das relações trabalhistas:as autoridades nacionais não possuem quase nenhum acesso a dados sobre os empregados de plataformas digitais — isso precisa No futuro, as plataformas digitais terão que divulgar informações sobre seus trabalhadores. Deverão, portanto, prestar contas sobre seus funcionários às autoridades competentes, assim como todas as outras companhias já fazem agora.

“A definição precisa do futuro do trabalho e das suas dimensões humanas e sociais estão, cada vez mais, em jogo.” A Comissão Europeia faria bem em definir isso com clareza imediatamente, declara Silvia Rainone, pesquisadora sobre as leis trabalhistas, as empresas digitais e o diálogo social no ETUI.sco


Traduzido do inglês por João Paulo Salvatori /Revisado por Graça Pinheiro

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